sábado, 29 de agosto de 2009

Palavras para relaxar

Tenho pelas palavras, assim como por qualquer outra coisa, preferência por umas em detrimento a outras. De algumas, faço uso quase que diariamente. Ora por conta dos ofícios, ora por simples paixão ou devido ao curto vocabulário, cuja extensão não me atrevo a medir. Quem tem rico vocábulo não costuma repetir palavras, exceto, como falei, por amor.
Tenho um aluno que tudo pra ele é caô. Precisei ir aos dicionários para entender o significado, pois o próprio aluno me disse que “caô” era “caô”. Como a conversa não ia progredir, resolvi fazer o dever em casa. Não encontrei no Houaiss, edição de 2001, nem no Aurélio, edição mais antiga ainda. Desisti de procurar em outros e resolvi consultar o meu ex-professor Cláudio César Henriques, autor de vários livros de gramática (até hoje nega ser gramático), membro da Academia Brasileira de Filologia, meu personal (palavra na moda) philologystic (não está na moda, nem nos EUA). Segundo o filólogo, "caô" é papo furado, conversa fiada, algo em que não se deve acreditar. Confesso que imaginava ser exatamente isso, mas temia pelo resultado, que, como supunha, me deixaria frustrado. Quer dizer que em algum momento de minha aula, previamente preparada num final de semana, onde deixei de, no mínimo, brincar com o meu cão, joguei conversa fora? Fui um caozeiro, aquele que faz ou comete caô. Esperava que tivesse outras definições mais amenas, segundo Henriques, não as há. Fazer o quê, o jeito é mudar a forma de dar aula ou, o mais difícil, convencer o meu aluno que o termo, além de não estar na moda, é chulo, principalmente quando dito a um professor. Se ele disser que isso é caô, a mim só restará encaminhá-lo à direção da escola. Caozeiro, eu, imaginem.
Voltando à elas, palavras, adoro a palavra refestelado. Sei lá, parece que recostado somente não funciona, não relaxa o bastante, o suficiente. Me lembra, não me perguntem porquê, o João Ubaldo Ribeiro numa rede, na Ilha de Itaparica, relendo um dos seus romances. Mas refestelado é uma palavra fora de moda, nada usual. Os sinônimos repimpar-se, refocilar-se, esses então, nunca os ouvi; se os li, não me lembro. Não vou incomodar o personal philologystic com mais essa consulta, já encerrei a minha cota semanal, e nesse momento, o Cláudio pode estar refestelado no num sofá, assistindo à TV Escola, para ter assunto para o seu blog, se não for ele o assunto. Embora adore o adjetivo refestelado, já não gosto do verbo, só porque é pronominal. Não gosto de nenhum verbo pronominal. Os verbos pronominais parecem esses carros com um reboque. A impressão que tenho, associada ao medo, é que em algum momento vou colocar o reboque na frente do carro e provocar um acidente gramatical, embora saiba que nós brasileiros preferimos a próclise à ênclise, uma coisa que nos diferencia e muito dos portugueses. Com certos verbos, além de ser proibido, nunca funciona.
Cá para nós, refestelado é ou não é uma palavra bacana? No entanto, pouco a usamos, embora gostemos de nos refestelar. Olha ele aí, o maldito pronome, pedindo para ser atropelado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário