terça-feira, 1 de junho de 2010

Cabo Sarmento, o vingador.



O sargento Teodósio nem se apresentara ainda ao quartel e sua fama de mau se espalhara na tropa. O encarregado de fazer o marketing negativo foi o cabo Sarmento, que, segundo o próprio, servira com o sargento no Rio de Janeiro. Aliás, corria nos bastidores que o sargento Teodósio fora o responsável pela transferência do Sarmento, a contragosto, claro, porque o Sarmento estava bem instalado no Rio. Agora vinha ele, certamente para transferir o Sarmento para uma fronteira. O Sarmento saiu de férias, depois pediria licença especial, não queria ver a cara do desafeto. E o Teodósio se apresentou. Cara de mau.
Teodósio era mesmo muito mau. Menos graduado que ele, não havia conversa: atropelava. Exigia continência até de outro sargento mais moderno. Quando a tropa saia para fazer algum tipo de exercício, o Teodósio não ia. Diziam que era peixinho do comando. Mas, segundo o Sarmento, o problema era outro. E mostrou uma foto. “Que que isso!?” exclamaram todos. Era a mulher do Teodósio. Um mulherão. E o sargento tinha medo de ser corneado. Não era pra menos. E foi aí que a língua ferina do cabo mais uma vez entrou em jogo. Ele, o cabo Sarmento, espalhou que já fora amante da Sonja. Por isso, o Teodósio o odiava e o transferira para Manaus. “Estou fazendo o meu requerimento para sair de seis meses”, disse o Sarmento. “Quando eu voltar, se esse sujeito estiver aqui ainda, peço a minha baixa”, emendou. E lá foi o Sarmento em direção à ala administrativa, ao departamento de pessoal. Meia hora depois volta ele, desanimado, cabisbaixo. Não poderia sair de licença, o quartel estava com deficiência de pessoal. Lamentou-se e, falando baixo, como se quisesse que poucos o ouvissem, murmurou: “Vou procurar Sonja e encher esse calhorda de chifres”. Nesse dia o sargento estava de serviço. Dia seguinte, o Sarmento volta todo sorridente. Dissimulado, não revela como fora a noite, mas todos imaginavam. Junto com as felicitações vieram os pedidos de cuidado, pois a soldadesca que ficara no quartel sentiu de perto a raiva do Teodósio. Não viam a hora de ele abandonar o posto e ir em casa, de surpresa.
Como numa freada, a vida no quartel se ajeitou. Teodósio de serviço, alegria do Sarmento e da tropa. Estava ousado, trazia até fotos da Sonja pelada, como para provar o feito. Até que um dia, o cabo chegou para os colegas e abriu o jogo:
_Rapaziada, a Sonja levou todo o meu dinheiro. Já vendi o carro para o marido dela a preço de banana, revelou.
_Como assim!? perguntaram, incrédulos.
_Não revelei pra vocês, mas a Sonja me cobra pelos programas, e não é pouco, aliás, ela cobra de todo mundo. Se algum de vocês quiser, eu levo até ela, desabafou.
_Caro quanto, quiseram saber os amigos.
_Já devo mais de vinte mil reais, revelou. E vou parar com isso. O cara sempre descobre, numa dessas eu acabo morrendo e bau-bau, adeus Sarmento, o vingador.
_Mas você não pode fazer isso com a gente, imploraram.
E faria, caso os amigos não tivessem construído uma vaquinha para levantar quarenta mil reais para o cabo quitar a dívida e ficar com uma sobrinha para recomprar o carro, além de uma “ajuda motel”. Mas valia a pena, porque o Sarmento prometera fotos fazendo sexo, sem revelar o rosto, lógico. Ele usaria uma máscara, e mostrou ali a máscara, e todos saberiam que era ele, Sarmento, o vingador da tropa.
E foi assim que começaram a surgir algumas fotos da Sonja fazendo sexo com um sujeito mascarado. A tropa se sentia vingada dos castigos impostos pelo sargento. O Sarmento comprou um carro novo e caro, e mostrou uma foto com a Sonja ao lado, no banco do carona, mas essa ele não deixou cópia com ninguém. Dizia que até ali todos eram amigos, mas no futuro as fotos podiam ser usadas contra ele. Os soldados entenderam.
E a vida prosseguia, tranqüila. Tranquila até o dia em que um soldado que trabalha na lavanderia encontra num dos bolsos do uniforme do cabo uma foto da Sonja com uma dedicatória no verso: “Aos meus dois amores, meu marido Teodósio e meu irmão Sarmento, assinado: Sonja.

Nenhum comentário:

Postar um comentário